
De forma a responder a esta pergunta, é importante, antes de mais, salientar que a dor faz parte da vida. O nosso corpo foi feito com a capacidade de sentir dor.
Podermos sentir dor é normal. O facto de sentirmos dor significa que algo não está totalmente normal. Mas, na maior parte dos casos, ainda bem que a sentimos.
Passo a explicar:
A dor é uma resposta do organismo humano a algo que nos aconteceu. Uma forma de entendermos melhor é dizermos que a dor é uma estratégia que o nosso corpo tem de “comunicar” connosco. Da mesma maneira que, quando o nosso corpo deteta uma quantidade insuficiente de água a circular, o cérebro envia a sensação de sede. Assim, para nos dizer que algo não está bem, a maior parte das vezes o organismo humano recorre ao sinal de dor.
Imaginemos que não sentíamos qualquer tipo de dor. Poderia, por exemplo, dar-se o caso de tocarmos com a nossa mão em algo a arder e deixarmos a mão ficar queimada, por não nos termos apercebido do que estava a acontecer. Simplesmente porque não sentimos a dor.
Vendo por esta perspetiva, podemos mesmo concluir que a dor pode até ser algo que nos protege. E são várias as situações em que tal é justamente o caso.
A maioria das nossas dores devem-se a traumas/traumatismos ou lesões, e estão quase sempre relacionadas com um processo inflamatório. Os agentes inflamatórios são substâncias produzidas pelo nosso próprio corpo e que produzem ou aumentam a sensação de dor. Mas essa dor é protetora, pois o facto de doer faz com que utilizemos menos aquela região do corpo, diminuamos o esforço, e tenhamos maior cuidado com essa região inflamada. Este cuidado que temos, de forma inconsciente, permite evitar um agravamento da lesão ou maiores consequências negativas do trauma/traumatismo.
Por exemplo, caso um atleta que fez um entorse do tornozelo durante um jogo de voleibol não sentisse dor, ele continuaria a jogar até ao intervalo e um entorse de grau 1 poderia tornar-se um entorse de grau 3, ou mesmo pior.
Podem igualmente surgir dores devidas, não a traumatismos ou situações agudas (lesões, intervenções cirúrgicas, acidentes, sobrecargas), mas sim a situações ou fatores mais crónicos. Por exemplo, alguém que passa várias horas a trabalhar num escritório numa posição incorreta, pode nunca sentir dor na coluna até um determinado dia em que acorda com muita dor num local específico. Essa dor não se deve a um trauma ou lesão que acabou de acontecer, mas a um conjunto de alterações no seu corpo (desalinhamentos articulares, desequilíbrios musculares, tensões musculares, etc.) que “silenciosamente” foram acontecendo devido à má postura. Finalmente o corpo como que diz: “não posso mais, não podes continuar assim!”, e envia o sinal de dor.
Nestes casos, será mais difícil encontrar a causa da dor, bem como o tratamento adequado para ela, pois muitas vezes não é possível identificar de imediato a verdadeira origem do problema. Além disso, o tratamento será igualmente mais demorado, para ser verdadeiramente eficaz (corrigir definitivamente o problema), pois implicará uma correção de diversos fatores e de diversas estruturas que foram afetadas com o tempo pela má postura (no caso do exemplo mencionado).
Existe ainda a chamada “dor crónica”, aquela que persiste por um período de mais de 3 meses. A causa deste tipo de dor pode ter sido originalmente uma situação aguda, ou pode ter sido uma situação crónica, mas a verdade é que a própria dor se tornou crónica.
A dor considera-se crónica pela sua duração, mas sobretudo pelo impacto que ela tem na vida da pessoa que convive com ela, pois vai influenciar e ser influenciada por vários aspetos da vida do paciente
A dor crónica é algo tão complexo que vale a pena explorar este assunto num outro artigo dedicado só a ela, mas fica já este conhecimento.
Fisioterapeuta Ágata Melo